martes, 19 de febrero de 2008

TEORÍAS ANTROPOLÓGICAS (en portugues)

TEORIAS ANTROPOLÓGICAS

Evolucionismo:

Na época histórica de seu aparecimento como ciência, a antropologia sofreu a influência da idéia dominante no mundo científico: o evolucionismo, consagrado pela publicação de A origem das espécies, de Charles Darwin, em 1859. Por isso, na segunda metade do século XIX, a nascente ciência concebeu os diferentes grupos humanos como sujeitos em desenvolvimento. As distintas sociedades evoluíram toas na mesma direção, passando por etapas e fases de desenvolvimento e diferenciação cultural inevitáveis e escalonadas, seguindo uma transformação que levaria do simples ao complexo, do homogêneo ao heterogêneo, do irracional ao racional. Para os antropólogos evolucionistas, todos os grupos humanos teriam que atravessar necessariamente as mesmas etapas de desenvolvimento, e as diferenças que podem ser observadas entre as sociedades contemporâneas seriam apenas defasagens temporais, conseqüência dos ritmos diversos de evolução.
Embora hoje em dia as principais teses evolucionistas estejam superadas, é considerável a maneira pela qual continuam influenciando a linguagem vulgar e o próprio vocabulário especializado da antropologia. Assim, às vezes fica difícil ao especialista descrever fenômenos antropológicos sem ter que recorrer a vocábulos viciados pelo conteúdo evolucionistas que os impregnou durante muitos anos. Nesse sentido a utilização de conceitos como “sociedades primitivas”, “civilizações evoluídas” etc. pressupõe uma aceitação implícita de seu fundo ideológico evolucionistas. Para evitar confusões, muitos antropólogos falam hoje de “sociedades de tecnologia simples”, ou “sociedades de pequena escala”, em oposição a “sociedades de tecnologia complexa ou “sociedades industriais”.
Os mais influentes antropólogos evolucionistas foram o americano Lewis Henry Morgan e o inglês Eward B. Tylor. Morgan publicou em 1877 seu estudo Ancient Society (A Sociedade Primitiva), no qual distinguia três etapas por que passaram, ou passarão, todas as sociedades humanas: selvajaria, barbárie e civilização, numa seqüência obrigatória de progresso. De igual forma, estabeleceu vários estágios sucessivos para a formação da família, os quais iriam desde a promiscuidade primitiva à família bilateral moderna de tipo europeu.
Tylor, por sua vez, realizou estudos comparativos das manifestações religiosas as diferentes sociedades humanas, acreditando, depois disso, poder estabelecer três etapas na evolução da ideologia religiosa dos povos:

animismo, politeísmo e monoteísmo. Embora as teses de Tylor tenham sido amplamente criticadas, suas concepções sobre a evolução das religiões continuam presentes na linguagem vulgar.

O evolucionismo materialista de Morgan influenciou consideravelmente as primeiras abordagens marxistas da antropologia. Em particular, foi o caso de Friedrich Engels, que escreveu A origem da família, da propriedade privada e do estado baseando-se claramente na leitura de Ancient Society.
A escola evolucionista mostrou-se consideravelmente carregada de preconceitos etnocêntricos, o que levou seus representantes a considerarem a sociedade européia como a mais evoluída e a acreditarem que todas as outras tenderiam a alcançar a mesma perfeição. Se for levado em conta, além disso, que nem sempre se dispunham de conceitos suficientemente diferenciados de encaixar as sociedade - e as raças- num quadro evolutivo gerasse conclusões precipitadas e errôneas.
No entanto, em defesa da escola evolucionista é preciso lembrar que a antropologia era então uma ciência quase inexistente, cujo desenvolvimento muito se beneficiou dos estudos e esforços dos adeptos dessa escola. Quando tais teses começaram a ser abandonadas pela maioria dos antropólogos, os métodos e procedimentos da nova ciência já estavam encaminhados e ela começava a dar seus frutos.

Difusionismo:
Nos últimos anos do século XIX e nas duas primeiras décadas do século XX, os estudos antropológicos foram influenciados por uma tendência oposta ao evolucionismo: o difusionismo cultural. Os autores difusionistas estabeleceram a premissa de que as diferenças observáveis entre sociedades distintas são irredutíveis a simples defasagens numa mesma trilha cultural, paralela e independente. A mudança e o progresso culturais se deviam, isto sim, ao fato de algumas sociedades se apropriarem de elementos e outras, aperfeiçoando-se dessa maneira. As semelhanças ente culturas diversas deviam ser explicadas não por terem atravessado etapas semelhantes de desenvolvimento, com garantiam os evolucionistas, mas sim porque, na história das sociedades, estava presente um fenômeno de difusão de traços culturais de umas para outras. Esses traços culturais teriam nascido em lugares e momentos históricos distanciados entre si, mas teriam tido uma progressiva difusão, a partir do lugar de origem, até chegarem a seu estado atual.

Em geral, o pensamento difusionista dá como certo que a novidade cultural é extremamente rara, sendo muito mais freqüente a relíquia cultural. O enfoque histórico, portanto, persiste entre os difusionistas.
Teorias hiperdifusionistas:
Pouco antes da primeira guerra mundial, um grupo de antropólogos austríacos e alemães constituiu a escola de Viena, cujos representantes máximos foram Fritz Graebner e o padre Wilhelm Schmidt, autor de uma teoria dos ciclos culturais que obteve notoriedade em sua época. A escola de Viena considerava que todas as culturas existentes na atualidade descendem, por um processo de difusão, de alguns poucos centros nos quais se teriam realizado todas as invenções culturais.
Mais extremistas que seus colegas germânicos, alguns antropólogos britânicos fixaram uma única fonte de todas as culturas: o antigo Egito. Segundo eles, manifestações como as pirâmides das culturas pré-colombianas na América seriam uma transcrição das pirâmides egípcias.
A escola hiperdifusionista, entretanto, perdeu rapidamente o prestígio em favor de outras concepções antropológicas mais próximas da realidade concreta. A época em que esteve em plena vigência, a concepção difusionista das sociedades foi fértil em pesquisas antropológicas de campo. A partir do início do século XX, começou-se a considerar que a primeira tarefa do pesquisador era estudar in loco e recolher em primeira mão os dados que usaria para chegar a conclusões.
O interesse do antropólogo começou a distanciar-se das tendências historicistas e se fixou cada vez mais nas sociedades contemporâneas.
Funcionalismo:
O germano-americano Franz Boas, considerado um dos pais da antropologia americana do século XX, era um cientista de formação naturalista; por isso, encarou com grande ceticismo tanto as teorias difusionistas como as evolucionistas. Boas preferiu a concepção funcionalista de uma cultura; para ele, uma cultura é um conjunto unitário que deve ser estudado em sua totalidade, e, composto, como uma máquina, de diferentes peças interdependentes. Em seus trabalhos sobre os esquimós, deixou bem fundamentada a metodologia do trabalho de campo, atividade a que seus discípulos iriam dar especial relevância. O enfoque de Boas, embora funcionalista, não deixa de estar matizado pelo historicismo, já que ele

sempre se interessou pela forma como se haviam desenvolvido no tempo as instituições culturais.
Depois da primeira guerra mundial, as abordagens históricas das sociedades foram perdendo adeptos e a escola funcionalista começou a ganhar relevância. Bronislaw Malinowski, seu mais eminente representante, sustentou que o objetivo da pesquisa antropológica deve ser a compreensão da totalidade de uma cultura, inseparável da percepção da conexão orgânica de todas as suas partes. A comparação entre culturas e a abordagem histórica não têm sentido para Malinowski; só faz parte de uma cultura aquilo que, no momento em que se estuda, tem nela uma função. A única maneira de perceber um elemento de uma cultura é analisar a função que tem esse elemento dentro dela. Não se pode compreender uma instituição social sem conhecer suas relações com as outras instituições da mesma sociedade. As atividades econômicas, o sistema de valores e a organização de uma sociedade constituem um complexo inter-relacionado cuja descrição é necessária para que se possa estudar adequadamente essa sociedade.
Dentro da tendência funcionalista, a escola sociológica francesa, encabeçada por Émile Durkheim, teve notável influência sobre o pensamento antropológico. Em Règles de la méthode sociologique (1895; Regras do método sociológico), Durkheim deixou bem estabelecido que, no campo social, existe um aspecto da realidade que vai além dos simples comportamento individuais. É preciso, portanto, estudar os fatos sociais como se fossem coisas em si, independentes da consciência dos indivíduos que formam a sociedade.
O intelectualismo analítico e a concepção da sociedade como um todo orgânico, como um sistema - características da escola sociológica francesa -, ao lado da tradição empirista, que busca fatos - marca das escolas anglo-saxônicas e, em parte, da germânica - são talvez as duas bases fundamentais em que se assenta a moderna antropologia social.

Estruturalismo:
Marcel Mauss, fundador do Instituto de Etnologia da Universidade de Paris, foi mestre de toda uma geração de antropólogos europeus. Seu enfoque, em princípio funcionalista, conquanto mais centrado na sociedade como um todo indivisível do que como uma soma de inter-relações entre indivíduos, deu origem à escola estruturalista. Baseando-se em conceitos derivados da matemática formal e da lingüística, os antropólogos estruturalista buscaram compreender uma dada sociedade extraindo seu modelo estrutural. Os
procedimentos estruturas demonstraram sua utilidade para o conhecimento dos sistemas de parentesco e dos sistemas de mitos. Mas a absoluta falta de visão histórica da escola estruturalista e sua análise meramente estática da realidade foram amplamente criticadas.
Alguns dos principais representantes da escola estruturalista foram o britânico Arnold R. Radcliffe Brown e o francês Claude Lévi-Strauss.
Culturalismo:
No período entre as duas guerras mundiais desenvolveu-se, fundamentalmente nos Estados Unidos, uma corrente culturalista em antropologia, cuja premissa básica era a de que uma dada cultura impõe um determinado modo de pensamento aos homens nela inseridos. A cultura condiciona o comportamento psicológico dos indivíduos, sua maneira de pensar, forma como percebe seu entorno e como extrai, acumula e organiza a informação daí proveniente. Nesse sentido, foram significativos os trabalhos de Ruth Benedict, realizados na década de 1930, sobre os índios pueblo do sudoeste dos Estados Unidos - os quais, apesar de imersos num meio físico semelhante ao das etnias circunvizinhas, raciocinavam de forma muito diferente diante de problemas idênticos.
Margaret Mead analisou principalmente a importância da educação na formação da personalidade adulta. Ralph Linton e Abram Kardiner, por sua vez, expuseram o conceito de personalidade de base, que consistiria num mínimo psicológico comum a todos os membros de uma sociedade.
Outras escolas antropológicas:
os antropólogos da União Soviética e de outros países socialistas mantiveram viva a tradição da antropologia marxista, de raiz evolucionista. Em alguns países ocidentais, especialmente na França, a influência do pensamento marxista se refletiu sobretudo em alguns aspectos de chamada da antropologia econômica.
Por outro lado, alguns antropólogos americanos se mantêm fiéis a uma concepção evolucionista das culturas, embora matizando-a, referindo-se a ela como um evolucionismo multilinear.
Métodos da antropologia cultural
O antropólogo cultural atua basicamente mediante o trabalho de campo nas comunidades que deseja estudar, com freqüência durante mais de um ano. Os métodos de trabalho são, fundamentalmente, variações em torno de dois procedimentos, a entrevista de informantes e a chamada observação participante. Se em certas comunidades a maioria de seus membros se dispõe a prestar abundantes informações sobre seu modo de vida, em outras o pesquisador tem de se esforçar para ganhar a confiança de umas porcas pessoas que concordarão em lhe prestar informações. É ainda da maior importância que procure aprender a língua local, para ganhar a simpatia dos entrevistados, compreender os comentários e conversas à sua volta e captar com precisão o significado social de determinados comportamentos, mal expresso quanto traduzido. A seguir, o antropólogo tenta entrevistar informantes que ocupem distintas posições (profissionais, sociais, econômicas etc.) na comunidade e compara as informações fornecidas.
No entanto, um nativo pode aceitar como “naturais” aspectos de sua cultura que são de acentuado interesse para o antropólogo. Por isso, existem muitos aspectos a que o pesquisador só pode ter acesso através da “observação participante”, a participação do pesquisador nas atividades normais da vida comunitária: trabalho cotidiano, cerimônia religiosas, ritos de iniciação, atividades de lazer etc. Normalmente a observação participante é a maneira mais fácil de perceber a complexidade das interações sociais. Além disso, só por meio dela o antropólogo pode se dar conta do significado emocional de uma da atividade humana: uma coisa é ouvir a pormenorizada descrição de uma penosa expedição de caça, outra é participar pessoalmente dela.
Antropologia física
Como se viu, segunda metade do século XIX ficou bem clara uma primeira diferenciação dos estudos antropológicos entre os que se referiam ao homem como ser social e os que o tomavam como objeto de estudo do ponto de vista de suas características biológica. Desde então, a antropologia física se desenvolveu em torno de dois objetivos principais: de um lado, o desejo de encontrar o lugar que o homem ocupa dentro da classificação animal, e averiguar sua história natural. De outro, a intenção de oferecer uma definição inequívoca das diversas categorias em que se pode dividir o conjunto do gênero humano, de acordo com as diferenças biológicas que os homens apresentam entre si.
O primeiro desses objetivos se traduziu na tentativa por parte dos pesquisadores, de reconstruir a linha evolutiva que teria vindo dos primatas até o homem. Foi essa tarefa que se popularizou, na segunda metade do século XIX, com o nome de “busca do elo perdido”. No século XX, a matéria adquiriu um caráter mais científico e se vinculou estreitamente com a paleontologia ou estudo dos fósseis. Importantes descobertas de “homens macacos”, primeiro na África oriental, permitiram um conhecimento mais precioso da evolução dos hominídeos. Destacaram-se nesse nesses trabalhos antropólogos como os da família queniana Leaky (Louis Seymour Blazett e Mary, assim como o filho do casal, Richard) e o americano D. C. Johanson. Curiosamente, essa disciplina adquiriu tal importância nos países da Europa continental, tais pesquisas não costumam ser consideradas propriamente antropológicas e são classificadas como uma forma de paleontologia, a qual é vista como um instrumento da outra.
De qualquer modo, realizaram-se classificações raciais bastante complexas, mais que logo demonstrariam sua insuficiência, já que se guiavam basicamente pelo critério de dar importância maior aos traços mais visíveis do corpo humano - formato do rosto, cor da pele etc. - que não são necessariamente os traços diferenciadores mais importantes.
Por volta de 1900, desencavaram-se os velhos trabalhos de Mendel sobre a hereditariedade, publicados 35 anos antes, e rapidamente a ciência da genética ganhou enorme vigor. Por outro lado, a descoberta dos grupos sangüíneos, seguida de muito perto pelas outras relativas às características bioquímicas do corpo humano, pôs a descoberto a superficialidade das classificações raciais baseadas nas características morfológicas externas.
A antropologia na atualidade
A principal dificuldade em que se debate a antropologia cultural consiste em sua carência de um corpo unificado de conceitos, problema ainda não resolvido. Embora lentamente pareça estar-se cristalizando um fundo comum de terminologia, de utilização universal e com significa unívoco, é esse o grande obstáculo para que a antropologia cultural seja considerada uma verdadeira ciência.
Outro problema com que se defrontam os antropólogos culturais é o fato de estarem desaparecendo as culturas não européias, ou tradicionais - seu objeto de trabalho habitual por mais de um século -, atropeladas pela cultura de caráter europeu, hoje convertida em universal. Nesse confronto as sociedades tradicionais ou estão morrendo ou sofrendo processos de aculturação e de adaptação tão intensos que seria difícil reconhecer, nelas, sua realidade primeira.
Por outro lado, pesquisadores de diversas nacionalidades, e não apenas europeus e americanos desenvolvem estudos antropológicos: latino-americanos, africanos, indianos, japoneses, entre outros, vieram acrescentar seus pontos de vista à discussão geral.
Um campo de trabalho aberto aos antropólogos culturais nos anos que se seguiram à segunda guerra mundial foi o das investigações que conduzem à melhor compreensão dos povos do Terceiro Mundo, com o objetivo de facilitar as iniciativas governamentais voltadas para o estímulo às mudanças ou para a incorporação das sociedades tradicionais ao modo de vida da sociedade industrial. Assim, por exemplo, é comum que, ao prepararem uma campanha de alfabetização, os governos ou as entidades promotoras contratem os serviços de antropólogos para que realizem estudos prévios que possam orientar as atuações.
No que se refere à antropologia física, são vários os campos de recente desenvolvimento que interessam de modo particular às suas pesquisas. Entre eles estão a ecologia humana, que estuda a relação do homem com seu meio e que também ocupa os antropólogos culturais, e a genética humana, que estuda o comportamento dos genes causadores dos traços herdados dos indivíduos e, portanto, trata da variabilidade humana.